Modificações na estrutura da pasta enfraquece pautas ambientais
O polêmico projeto que modifica a estrutura ministerial do terceiro mandato do governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva e retira atribuições das Pastas do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas vem sendo criticado por organizações de defesa do meio ambiente e dos povos originários.
Integridade ESG ouviu Marco Antônio Mota, conhecido como Marquinho Mota, indigenista e coordenador de projetos do Fórum Amazonia Oriental (FAOR). Para ele, em primeiro lugar, o parecer do relator da Medida Provisória 1154/23, Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL), que propõe as modificações, ofende os eleitores brasileiros.
“Classifico a proposta como um atentando contra a população que votou em Lula, cujo programa de governo não falava em diminuir o poder do Ministério Ambiental nem em tirar da pauta principal a causa indígena. O Congresso, ruralista, está tentando reeditar o governo passado. As tentativas de modificar a MP dos Ministérios representam uma forma de enfraquecer as pautas ambientais, que podem afetar o avanço do agronegócio na Região Amazônica e na Mata Atlântica. É temeroso vivemos uma espécie de parlamentarismo disfarçado, onde o congresso pode tudo e onde há pouca reação da sociedade”, avalia.
No entanto, o feitiço pode virar contra o feiticeiro, alerta o ambientalista, pois o enfraquecimento das regras de preservação dos biomas brasileiros pode prejudicar o próprio agronegócio.
“Acho muito perigoso para as pautas ambiental e indígena, tão vendidas no exterior, e para o agro, devido à pressão na exportação das commodities, cada vez mais exigentes. O Brasil perde como um todo”, resume.
Uma das principais mudanças propostas pelo relator da MP, que deve ser votada até dia 1º de junho para não perder a validade, retira da Pasta comandado por Sônia Guajajara as atribuições do reconhecimento e da demarcação de terras indígenas para o Ministério da Justiça.
“Termos um governo afiado com a causa indígena, apesar de Flávio Dino, como ex-governador do Maranhão, não ter um histórico ambiental muito bom. Hoje, porém, Dino é um dos principais articuladores do presidente. Assim como a Sônia Guajajara, acredito que possamos ter uma parceria entre os dois Ministérios, caso essa mudança seja efetivada. Mas se você cair em um Ministério da Justiça, como no governo passado, seria um desastre. Nos quatro anos do último governo, não houve nenhuma demarcação, pois a vontade de demarcar e homologar é política, e não só técnica. Afinal, temos mais de 200 terras indicadas para serem demarcadas e os processos não andam. Se o próximo governo for financiado pelo agro, não sairá nada”, alerta.
Apesar de vislumbrar o diálogo com o atual Ministério da Justiça na questão da demarcação de terras, Marco Antônio Mota frisa que o esvaziamento da Pasta, criada pelo atual presidente, pode acarretar na própria perda do sentido de sua existência na Esplanada.
“Com essas mudanças, o Ministério dos Povos Indígenas perde sua função principal. Será um Ministério “para gringo ver”, para organizar a festa do Dia 19 de Abril (Dia do Índio). É isso que queremos?”, questiona o coordenador da FAOR.
O Supremo Tribunal Federal deverá retomar o julgamento do Projeto de Lei do marco temporal de demarcação de terras no dia 7 de junho. Os povos indígenas deverão recorrer cada vez mais à judicialização para conseguir demarcar suas terras, confirma o ativista.
“Judicializar sempre foi uma das saídas encontradas pelas populações indígenas. Mas os tribunais são emperrados nessa questão. Sabemos que no próprio Supremo há interesses que vão além da defesa de democracia. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, é dono de terras no Mato Grosso. Vai votar a favor dos povos indígenas? Mas os índios resistem há 523 anos, e não vai ser agora que vão parar. Vão continuar fazendo pressão nacional e internacional, resistir e lutar”, conclui.