Mesmo não intencionadas, empresas podem ser acusadas de forjar uma agenda ESG por não adotarem métricas eficazes de diagnóstico
À medida em que cresceu a preocupação ambiental no planeta e a agenda ESG ganhou vida própria no mundo dos negócios, surgiu o risco do compromisso vazio. Em meio às atraentes e crescentes linhas de financiamento em âmbito ESG, a sustentabilidade também pode pautar uma agenda forjada com ações de marketing barato e pouca transparência.
Para definir práticas fraudulentas do gênero, surgiu o termo “greenwashing”, ou seja, uma espécie de “lavagem verde”, por meio da qual as organizações maquiam seus resultados para aparentar virtudes ambientais e blindar sua reputação empresarial. De acordo com uma alarmante pesquisa anônima da Harris Poll para o Google Cloud, com 1.500 CEOs e outros líderes C-level em empresas com mais de 500 funcionários, a propaganda enganosa verde é corriqueira. Do total das pessoas que responderam à pesquisa, 58% dos líderes globalmente e 68% nos EUA disseram que suas companhias fazem greenwashing.
Os escândalos mais recentes atingiram gigantes do mercado financeiro, como o banco norte-americano Goldman Sachs, que enfrenta uma densa investigação da Securities e Exchange Commission (SEC), equivalente à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos. Há a suspeita de distorção de informações sobre critérios ambientais, sociais e de governança (ESG) direcionadas para seus clientes.
Na Alemanha, não foi diferente. O Deutsche Bank chegou a sofrer uma batida da polícia alemã após denúncias de que estaria praticando greenwashing ao desinformar seus clientes sobre a real sustentabilidade de suas aplicações financeiras. A falta de precisão na descrição das práticas empresariais, ou seja, a ausência de transparência, é central em ambos os casos.
“Não adianta fazer uma matriz de materialidade apenas com opiniões convergentes e positivas. É importante mensurar os impactos e dar voz aos stakeholders descontentes” Renata Brito, coordenadora do MBA de ESG Management do IAG – Escola de Negócios da PUC-Rio

No mercado financeiro, o greenwashing vem da concepção de produtos financeiros com a falsa promessa de impactos ambientais ou sociais, define a professora Renata Brito, coordenadora do MBA de ESG Management da Escola de Negócios da PUC-Rio (IAG).
“O Deutsche Bank está sendo acusado de promover fundos de investimento com apelo verde e sustentável, mas sem comprovar os critérios utilizados. Esse tipo de questionamento tem se intensificado à medida em que mais e mais fundos de investimento se auto intitulam verdes, sustentáveis ou ESG, sem qualquer explicação sobre a forma de seleção e decisão de investimento que justifique tal nomenclatura”, explica.
No entanto, nos Estados Unidos, a SEC tem ficado mais alerta para a lavagem de dados verdes. A entidade questiona fundos e impõe penalidades, pressionado por transparência e padronização. Porém, há ainda pouca transparência da parte dos fundos de investimento e oportunistas no mercado, avalia a especialista, que ressalta a necessidade de clareza e prestação de contas sobre os procedimentos antes de “sair vendendo um novo fundo ESG”, sob risco de descrédito do mercado.
Para a professora e pesquisadora da Fundação Dom Cabral (FDC), Luciana Faluba Damázio, o risco de greenwashing aumenta quando existe pressão de investidores.
“Se não houver uma intenção verdadeira, integrada à estratégia por meio da conexão com missão e propósito, não vai acontecer”, alerta Luciana Faluba Damázio, PhD e professora da Fundação Dom Cabral

“A maioria das empresas ingressa nesse movimento por pressões externas, ou seja, do consumidor ou dos investidores. Nesses dois casos, a chance de acontecer o greenwashing é bem alta. O primeiro passo é fazer a conexão com a missão e propósito e sensibilizar as lideranças. A comunicação com o mercado deve ser uma consequência”, alerta.
Métricas específicas para cada ação evitam acusações de lavagens
A fórmula para evitar o greenwashing está na seriedade do diagnóstico das empresas.
“Esse ato de forjar a adoção de medidas pró-meio ambiente pode ser evitado com a busca de diagnóstico sério dos impactos da empresa na sociedade, também chamados de externalidades, antes da adoção de qualquer prática aleatória”, esclarece a coordenadora do MBA da PUC.
Para tanto, cada empresa deve endereçar, resolver e melhorar seus impactos diretos e indiretos, como poluição, emissões de gases de efeito estufa, uso de recursos naturais, impacto social e contratação correta.
Se não tratar tais aspectos, o risco para as empresas é de serem acusadas de prática de greenwashing, mesmo que não intencionadas, por propalarem a adoção de medidas inócuas, alerta a professora. É nesse ponto que entra a importância das métricas — a forma mais eficaz de avaliar os impactos de uma agenda ESG. E os chamados dissidentes não podem ser excluídos dessa mensuração.
“Um novo modelo de produção, um novo produto ou um novo sistema deve ser monitorado nos seus impactos sociais e ambientais, independentemente da aparente aceitação pelo mercado. É importante mensurar os impactos e dar voz aos dissidentes, aos stakeholders descontentes. Não adianta fazer uma matriz de materialidade apenas com opiniões convergentes e positivas sobre a empresa e suas ações”, conclui a professora Renata Brito.
Mas as métricas funcionam no monitoramento, desde que exista uma intenção real, ressalta Luciana Damázio, especialista da FDC.
“Se não houver uma intenção verdadeira, integrada à estratégia por meio da conexão com missão e propósito, não vai acontecer. A mudança é muito grande e tem impactos na cultura da organização, por isso deve ser feita de forma gradual. Os avanços virão ao longo do tempo, mas dar os primeiros passos de forma planejada é fundamental”, pondera.