Crise energética mundial trouxe imperativos econômicos e da democracia
O conflito entre a Rússia e a Ucrânia não deverá ser um ponto de inflexão na agenda climática, mas pode atrasar o processo descarbonização da economia – redução das emissões de gases de efeito estufa, grandes poluentes e causadores do aquecimento da atmosfera. A avaliação é do economista Leonardo Paz (foto), analista de inteligência Qualitativa no Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getúlio Vargas (FGV NPII), para quem a transição para a chamada e economia de baixo carbono esbarra em imperativos econômicos e da democracia.
A guerra vai ser um freio na tendência que estava sendo verificada, desde 2016, de aceleração da agenda climática, disse ele ao portal Integridade ESG. Entre outras razões, porque o conflitou desencadeou uma crise energética mundial que trouxe outros imperativos econômicos e da democracia. “O dia a dia é o imperativo econômico da democracia”, ou seja, a economia precisa continuar funcionando e as pessoas têm que comer. Sem condições básicas de sobrevivência, não há democracia.
Existe um entendimento dos governos sobre o problema climático, explica ele, mas a conversão da economia marrom – emissora de gases poluentes – em economia verde é cara e, até por isso, acaba atrasando as políticas de inclusão social em países como o Brasil. “Os países que dispõem de mais recursos e tecnologia conseguem converter a mão de obra ocupada na economia marrom em força de trabalho verde com mais facilidade”, acrescenta.
A energia é um elemento de base, que impacta a produção de outros produtos. Se encarece, gera inflação em cascata. Por isso, a disponibilidade de energia é estratégica, como mostrou o conflito entre Rússia e Ucrânia. A interrupção do fornecimento de gás e petróleo da Rússia e da Ucrânia para o mundo, especialmente para o continente europeu, causou o aumento dos preços desses insumos e rebateu em toda a economia mundial, causando inflação e espalhando a fome.
Se, por um lado, o conflito acelerou investimentos no aumento da oferta de energias renováveis, por outro, possibilitou que o uso de óleo, gás e carvão voltasse a crescer, assim como a retomada de projetos intensivos na emissão de carbono.
Geopolítica – a segurança energética é uma questão geopolítica importante porque impacta o funcionamento da economia, o nível de emprego e a segurança alimentar, como ficou claro desde a invasão da Ucrânia pela Rússia. “O grande desafio é os países mais ricos compartilharem tecnologia com os mais pobres para que estes também consigam fazer a transição energética”, opina.

O Brasil tido como país com vantagens naturais capazes de elevá-lo à condição de protagonista na ação climática e chegou a ter um prestígio maior nesta agenda do que na econômica, afirma Paz. “O Brasil era influente e ouvido. Ao ser ouvido, o país consegue levar o debate para a frente e para o lado que o interesse, como a obtenção de recursos para prevenção, combate e monitoramento do desmatamento, como o Fundo Amazônia. Mas quando se coloca como ator irresponsável, perde importância. Ninguém quer dar dinheiro para um ator que não é ouvido, não tem influência, como aconteceu nos últimos tempos”, diz ele. O pior é que essa situação não mudará, de uma hora para a outra, mesmo se um novo governo for eleito em 2 de outubro. “Na diplomacia não funciona assim”, afirma Paz. Segundo ele, a mudança na imagem do país pode demorar um pouco, até porque os outros países têm interesses que nem sempre são os mesmos do Brasil. É o caso do setor agropecuário, por exemplo. Na opinião dele, a conta desse período recente em que o desmatamento aumentou e o Brasil retrocedeu no aspecto ambiental vai ser cobrada em toda e qualquer negociação diplomática por algum tempo.